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segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Brasil: Medalha de Bronze nas Olimpíadas de 1948


Durante cinco décadas, a revista carioca Fon-Fon! se reinventou. O semanário cultural ilustrado que se debruçava sobre os costumes do Rio de Janeiro no início do século 20 deu uma guinada editorial para atrair o público feminino da época. Seja com charges políticas afiadas ou com o slogan de “Revista para o lar”, o fato é que aquelas páginas não eram muito de flertar com o esporte. Então dá para dizer que é quase uma zebra a Fon-Fon! ser responsável por um rico acervo sobre um ponto fundamental da história esportiva brasileira: a Olimpíada de 1948, disputada em Londres no pós-Guerra.


Dono da revista e apaixonado por esportes, o jornalista André Sérgio da Silva estava ansioso por aquela edição dos Jogos, a primeira depois do jejum olímpico de 12 anos criado pela Segunda Guerra Mundial. Alemanha e Japão, vilões nos campos de batalha, não foram convidados, e a União Soviética não quis mandar ninguém. Com a Grã-Bretanha ainda juntando os cacos dos bombardeios, não havia dinheiro para construir um centro de treinamento sequer: os atletas foram acomodados em instalações militares e escolas adaptadas.

West Drayton Camp, onde ficou o Brasil. André Sérgio notou a raridade: havia uma TV no salão. André Sérgio tinha na manga a estrutura de uma grande revista e não pensou duas vezes: cruzou o Atlântico. Ao lado da esposa, Lygia Vianna da Silva, ganhou amplo acesso à delegação verde-amarela em treinos e competições. Para nossa sorte, ainda contratou a agência fotográfica Keystone e registrou tudo.

O casal testemunhou o bronze histórico do basquete masculino - a primeira medalha olímpica do Brasil em esportes coletivos. Viu nascer a trajetória gigante do saltador Adhemar Ferreira da Silva. Conviveu com o pai de Éder Jofre e observou mulheres pioneiras como a nadadora Piedade Coutinho e a corredora Melânia Luz.

Medalha de Bronze conquistada em 1948

Em 13 de agosto de 1948, o basquete brasileiro brotou no mapa-múndi. O bronze em Londres foi o tapinha inicial de uma trajetória que, nas décadas seguintes, acumularia outras medalhas olímpicas e títulos mundiais no masculino e no feminino. A origem de tudo está nas mãos daqueles dez heróis de camiseta. Os medalhistas foram Alberto Marson (o último a morrer, em abril de 2018), Ruy de Freitas, Affonso Évora, Bráz, Alfredo da Motta, Massinet Sorcinelli, Nilton Pacheco, Alexandre Gemignani, Marcus Vinicius Dias e o mais renomado deles: Zenny de Azevedo, o Algodão, que seria campeão mundial em 1959 e ganharia outro bronze olímpico em 1960.

Alexandre, Bráz e Marson

A pedreira começou na viagem para Londres, saindo do Rio de Janeiro num pinga-pinga de quase três dias por Rio Grande do Norte, Senegal, Portugal e, enfim, Inglaterra. Em solo britânico… bem, o solo é outra questão delicada, porque os treinos eram na grama esburacada de um campo de críquete, numa instalação militar a 90km do local dos jogos.

"Não tinha sequer uma parte cimentada em que se pudesse fazer qualquer treinamento de basquete. Só um gramado completamente esburacado, muito ruim". O relato, dado pelo pivô Marson à repórter Lydia Gismondi no Globoesporte.com em 2012, ganha vida com as fotografias que a Keystone produziu para a Fon-Fon! no West Drayton Camp. Na grama, sem tabela e cesta, restava ao técnico Moacyr Daiuto botar os jogadores para aquecer e pular carniça nos exercícios físicos.





Affonso Évora - que, assim como a revista, também tinha o apelido de Fon-Fon - era titular, mas pisou num buraco logo no primeiro treino e torceu o tornozelo. O drama era ainda maior: por corte de gastos, a delegação não tinha médico nem massagista. O próprio Affonso, que morreu em 2008, explicou a situação em depoimento gravado pela neta em Petrópolis: "Era eu mesmo me tratando, e meus companheiros me ajudavam fazendo compressas, noite e dia. Não tinha massagista, médico, nada. Assim fui levando, e só consegui voltar nos três últimos jogos".

Na quadra, o Brasil não estava entre os favoritos - ainda mais com o elenco econômico de 10 atletas, ao contrário das outras seleções, que tinham 12 ou 14.


A seleção abriu o torneio com duas vitórias apertadas sobre Hungria e Uruguai. Depois, meteu 76 a 11 nos donos da casa e bateu Canadá e Itália para fechar a primeira fase. Nas quartas de final, duelo ferrenho com a forte Tchecoslováquia e vitória por 28 a 23. A única derrota veio na semi-final, 43 a 33 para a França, que perderia a decisão para os Estados Unidos.


A disputa do bronze contra o México, no dia 13 de agosto, foi outro jogo pegado. O almanaque “The complete book of the Olympics” diz que Alfredo da Motta chegou a perder o calção e teve que voltar às pressas para o vestiário. Na raça, os heróis nacionais venceram por 52 a 47 e colocaram o Brasil no pódio, o que não acontecia desde 1920, quando a equipe de tiro levou ouro, prata e bronze na Antuérpia.

No material de André Sérgio da Silva, um curto relato do jogo batido à máquina, sem autor identificado, traz detalhes da festa em inglês: “Foi um dos jogos mais empolgantes do torneio, com os brasileiros reagindo em grande estilo após perderem o primeiro tempo por 25 a 17. No fim da partida, dirigentes e torcedores brasileiros correram em direção ao time, beijando e abraçando os atletas. Vários deles caíram no chão numa montanha de júbilo”.


Affonso Évora lembrou que a confederação nem queria que o basquete fosse a Londres, por causa da derrota no Sul-Americano no ano anterior. Com a medalha, tudo mudou: "Não parava de chegar telegrama. Ganhamos 10 dias de estada em Paris, recebemos 2 mil dólares de gratificação. Quando voltamos, fizemos um desfile pela Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro, em carro aberto". Reconhecimento merecido e uma recompensa para quem torceu de longe. No Brasil ainda não havia sequer televisão. Foi a primeira Olimpíada televisionada, mas até em Londres eram poucas as famílias que tinham aparelho em casa.


Fonte: GloboEsporte.com

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