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quinta-feira, 20 de outubro de 2022

A História e os Caminhos de Crescimento Interestadual do Basquete Interclubes no Brasil

O basquete foi trazido ao Brasil através da Associação Cristã de Moços (ACM) e se organizou primeiramente no Rio de Janeiro (então Distrito Federal), em Porto Alegre e em São Paulo. O primeiro torneio oficial disputado no Brasil foi o Campeonato Carioca de 1919, organizado pela Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, que teve como campeão ao Flamengo. A competição foi um quadrangular, tendo além da equipe rubro-negra, às equipes da ACM, do América e do Boqueirão do Passeio. O Fluminense acabou desistindo da disputa à última hora, mas entrou no ano seguinte e depois disto criou uma hegemonia temporária na cidade, com a conquista de 8 títulos consecutivos entre 1920 e 1927.

Já em Porto Alegre, as disputas oficiais começaram em 1923, ano no qual a equipe da ACM acabou como campeã gaúcha. Em São Paulo, o primeiro torneio oficial foi o Campeonato Paulistano (ou Campeonato Paulista da Capital), cujo primeira edição foi disputada em 1925, tendo as três primeiras edições sido conquistadas pelo Espéria. A partir de 1932 começou a ser disputado também o Campeonato Paulista do Interior, e no mesmo ano de 1932 houve a primeira edição do Campeonato Paulista, tendo o Palestra Itália (posteriormente Palmeiras) vencido às três primeiras edições. Nas seis edições seguintes, o Espéria faturaria 4 vezes e o Corinthians conquistaria 2 títulos. Depois disto, o torneio só teve uma edição disputada entre 1941 e 1950, tendo o Corinthians sido o campeão de 1947.

Em suas primeiras décadas, o basquetebol brasileiro dividiu suas forças entre as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, com uma ligeira hegemonia carioca perdurando até a metade da Década de 1950, a partir da qual o domínio passou a ser totalmente paulista. Não havia competições de clubes a nível nacional, no entanto, de 1925 a 1964 foram disputadas 26 edições do Campeonato Brasileiro de Basket, uma competição entre as seleções estaduais. Na largada deste torneio, as cinco primeiras edições já mostravam uma acirrada disputa entre a Seleção Paulista (três vezes campeã: em 1926, 1928 e 1929) e a Seleção Carioca (duas vezes campeã: em 1925 e 1927), com todos os cinco troféus decididos entre os selecionados do Distrito Federal (então no Rio) e do Estado de São Paulo.

Nos Anos 1930, questões políticas levaram a uma mudança de cenário. Em 1930, nem cariocas nem paulistas disputaram o torneio, vencido pela Seleção do Paraná, com o vice sendo da Seleção de Minas Gerais. Nas edições de 1931 e 1933 a ordem foi parcialmente reestabelecida (em 1932 o torneio não foi jogado) com cariocas e paulistas voltando a decidir o troféu, e cada um dos dois faturando mais um título cada.

De 1934 a 1937, a Seleção Paulista não jogou nenhuma das quatro edições disputadas, com a Seleção Carioca faturando quatro títulos: em 1934 e em 1936 deixando à Seleção do Espírito Santo em segundo, em 1935 à Seleção Fluminense (do antigo Estado do Rio de Janeiro, já que na época a cidade do Rio era a capital federal) e em 1937 superando à Seleção Mineira na final. Foi exatamente a partir deste período da história que o basquete do Rio de Janeiro conseguiu construir a hegemonia que perduraria até a metade dos Anos 1950.

Neste período, houve três fases bem marcadas de domínio no Campeonato Carioca, primeiro com o Flamengo, de Pedro Martinez, Manoel Leite Pitanga e Haroldo Lobo, tetra-campeão de 1932 a 1935, depois com o Riachuelo, de Ruy de Freitas, três vezes campeão nas cinco edições disputadas entre 1937 e 1941, e por fim com o Botafogo, de Affonso Évora e Ralph, vencedor de cinco das seis edições disputadas entre 1942 e 1947, época na qual despontava com a camisa do Clube dos Aliados, do bairro de Campo Grande, o jovem Algodão.

Já no Campeonato Paulista da Capital, já que o torneio estadual não foi disputado nos Anos 1940, ficaram demarcados dois claros períodos de hegemonia, primeiro com o Espéria, hexa-campeão entre 1937 e 1942, e vencedor de 8 das 10 edições jogadas entre 1937 e 1946, e depois com o Corinthians, de Angelim e Marson, hepta-campeão de 1950 a 1956, e vencedor de 9 das 10 edições disputadas entre 1947 e 1956 (perdeu o título de 1949 para o Espéria, por quem também viria a ser derrotado na final de 1957).

No "Brasileiro de Basket", a Seleção Paulista voltou a disputar o torneio a partir de 1938, edição na qual acabou derrotada na final pelo Seleção Carioca por 32 x 25. Na edição seguinte, o selecionado da cidade do Rio voltaria a superar aos paulistas e conquistaria seu hexa-campeonato consecutivo. O basquete da cidade de São Paulo voltaria a faturar o título no torneio que disputou em casa em 1940 (edição a partir da qual a competição passou a ser disputada a cada dois anos) assim quebrando temporariamente a hegemonia da Seleção Carioca. Mas o basquetebol do Distrito Federal provaria dois anos depois o quanto era forte e se sagraria novamente campeão em 1942, e desta vez com uma vitória dentro do Ginásio do Pacaembu, por 42 x 38, com Ruy de Freitas como seu máximo pontuador. Em 1944, faturariam o bi-campeonato, num torneio que proporcionou uma grande zebra na semi-final, quando a Seleção Mineira venceu à Seleção Paulista por 58 x 45, avançando para a final contra o quinteto carioca, que, como já dito, ficou com o título.

Depois da surpreendente vitória sobre os paulistas na semi-final de 1944, o basquete de Minas Gerais voltaria a mostrar a sua força em 1947, quando a competição foi disputada em Belo Horizonte e a Seleção Mineira, cujo principal jogador era Zé Luís, faria brilhante campanha e se sagraria campeã, batendo à Seleção Carioca na final. O basquete era incipiente em Minas, tendo o primeiro Campeonato Mineiro sido disputado em 1938, e com um amplo domínio em todo o primeiro decênio de disputa por parte do América Mineiro, hepta-campeão de 1943 a 1949, e vencedor de 9 dos 11 torneios disputados entre 1939 e 1949.

Mas o campeonato de seleções continuaria a ter um domínio do Rio de Janeiro, com a Seleção Carioca se sagrando tri-campeã brasileira nas edições de 1949, 1951 e 1953. Era a base da Seleção Brasileira que conseguiu a primeira conquista internacional expressiva do basquete nacional, a Medalha de Bronze nas Olimpíadas de 1948, em Londres. Mesmo ano no qual a cidade do Rio viu nascer uma forte dominância do Flamengo, deca-campeão carioca de 1951 a 1960, e vencedor de 14 das 17 edições do Campeonato Carioca disputadas entre 1948 e 1964. Os atletas rubro-negros formavam quase que a totalidade da Seleção Carioca que foi campeã brasileira no torneio disputado em 1949 em Salvador, na Bahia, no qual a final foi disputada em melhor de três jogos entre cariocas e paulistas, tendo a turma do Rio vencido o primeiro por 41 x 30, perdido a segunda por 22 x 20, e vencido a terceira, sagrando-se campeã, por 33 x 24, partida na qual 12 pontos foram de Alfredo da Motta e 9 de Algodão, tendo juntos os dois, portanto, feito 21 dos 33 pontos cariocas (não por acaso tendo os dois sido os dois pontuadores dominantes na conquista do bronze do Brasil nos Jogos Olímpicos de 48). Nesta conquista, a Seleção Carioca tinha a Algodão, Alfredo da Motta, Celso, Tião Gimenez e Mário Hermes, e a Seleção Paulista a Angelim, Massenet, Marson, Alexandre e Sílvio.

Dois anos depois, em torneio disputado em 1951 em Florianópolis, a Seleção Carioca - formada por Algodão, Alfredo da Motta, Tião Gimenez, Mário Hermes e Zé Mário - venceu na final por 35 x 27 à Seleção Paulista e foi bi-campeã. Em 1953, em Belo Horizonte, conquistou o tri-campeonato formada por Algodão, Alfredo, Godinho, Almir e Zé Mário, e tendo a Ardelin como sexto homem, e vencendo na final por 58 x 49 à Seleção Paulista que tinha a Angelim, Marson, Bombarda e Gedelo. O técnico tanto do Flamengo que dominava ao Rio de Janeiro quanto da Seleção Carioca tri-campeã brasileira era Togo Renan Soares, o Kanela, o mesmo que comandaria à Seleção Brasileira na conquista dos Campeonatos Mundiais de 1959 e 1963. Antes, porém, em 1954 foi jogado o 2º Campeonato Mundial, que teve como sede a cidade do Rio de Janeiro, tendo tido como palco ao Ginásio do Maracanãzinho. A Seleção Brasileira ficou com o vice-campeonato, perdendo o título para os Estados Unidos, e teve dois jogadores escolhidos para o "Quinteto Ideal" da competição: Algodão e Wlamir Marques.

E é justamente na metade dos Anos 1950 que emergiria o basquetebol do interior de São Paulo e, não por coincidência, dali em diante o domínio nas competições nacionais seria totalmente paulista. Quem teve grande influência nesta revolução foi o time do XV de Piracicaba, que conquistou pela primeira vez ao Campeonato Paulista do Interior em 1955, e que viria a ser tetra-campeão do interior de 1957 a 1960, além de ter sido a primeira equipe do interior a haver superado aos clubes da capital e conseguido ser a Campeã Paulista, título que ergueu em 1957 e em 1960, equipe do XV que tinha a Wlamir Marques, Pecente e Mané Bortolotti.

A partir de 1955 a Seleção Paulista foi penta-campeã do Campeonato Brasileiro de Basquete. Em 55, em Recife, venceu à Seleção Carioca na final por 57 x 41 com uma equipe que tinha a Miltinho, Wlamir Marques, Angelim, Pecente e Amaury Pasos, que venceram ao time formado por Algodão, Ardelin, Godinho, Olivieri e Édson Bispo.

Em 1958, em torneio disputado em Porto Alegre, a disputa foi acirradíssima, com a equipe formada por Miltinho, Wlamir Marques, Pecente, Amaury Pasos e Waldemar Blatskauskas sendo campeã após fazer 31 x 27 no 1º tempo e vencer por 56 x 53 à Seleção Carioca, que jogava com Algodão, Zezinho, Willi Pecher, Fernando Bro Bro e Édson Bispo.

Paulistas e Cariocas decidem em 1958

Em 1961, em Fortaleza, foi tri-campeã, e no ano seguinte, em Franca, o time formado por Mosquito, Rosa Branca, Wlamir Marques, Amaury Pasos e Édson Bispo conquistou o tetra, vencendo à Seleção Carioca por 68 x 53 na final. O basquetebol de São Paulo havia crescido vertiginosamente e se profissionalizado, a presença de Édson Bispo - vice-campeão com o Rio de Janeiro em 1955 e 1958, e campeão com São Paulo em 1961 e 1962 - é uma amostra da força econômica crescente do basquete paulista, atraindo aos maiores talentos do país para atuar por suas equipes. O basquete do Rio estava todo associado aos clubes de futebol, com os títulos do Campeonato Carioca ficando entre Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo, e nas divisões internas de receita só sobrando migalhas para o basquete. No basquete paulista poderia ter acontecido o mesmo se tudo tivesse ficado restrito a Corinthians e Palmeiras (que emergiu forte após ser campeão paulista invicto em 1958), mas além da força das agremiações do interior, também foi representativo o crescimento do Sirio na capital, clube que gerenciava exclusivamente a um time de basquete, sem precisar dividir recursos com o futebol. O Sirio foi campeão paulista pela primeira vez em 1959, voltando a conquistar o título em 1962 e 1967.

Paulistas e Cariocas decidem em 1961

E havia a força do interior do estado. O grande nome do XV de Piracicaba foi o genial Wlamir Marques. No início de 1962, ele foi contratado pelo Corinthians, e foi depois de sua saída, migrando para a capital, que se abriu espaço para o crescimento do basquete de Franca, que viria a ser batizada anos depois como "A Capital do Basquete Brasileiro". O cenário do interior aumentou sua força com o crescimento do Clube dos Bagres, da cidade de Franca, o qual foi hepta-campeão do Paulista do Interior entre 1962 e 1968, tendo por quatro anos consecutivos superado ao XV de Piracicaba na final, entre 63 e 66. Ainda assim, o domínio no Campeonato Paulista nos Anos 1960 foi do Corinthians, que com força econômica reuniu aos dois principais nomes do cenário nacional na mesma equipe: Wlamir e Amaury. A discrepância econômica do basquete paulista para o carioca ficou claramente demonstrada na última edição do Brasileiro de Seleções, disputada em 1964 em Fortaleza, quando os paulistas se sagraram penta-campeões e superaram aos cariocas com extrema facilidade: 119 x 60.

Foi em meio a este contexto que a partir de 1965 se oficializou a disputa de competições nacionais entre clubes e não mais entre seleções. Nos jornais da época nem se mencionava o nome Taça Brasil ainda, referindo-se à "melhor de três para se conhecer o representante do Brasil no Sul-Americano dos Clubes Campeões" ou ao "Iº Brasileiro de Clubes Campeões". Entre 26 e 29 de novembro, Corinthians e Vasco se enfrentaram, com o primeiro jogo acontecendo no Clube Municipal, no bairro da Tijuca, na Zona Norte do Rio de Janeiro, encontro no qual o alvi-negro paulista jogou desfalcado de Wlamir Marques, tendo os cruzmaltinos se aproveitado e vencido por 83 x 79, com brilhantes atuações de Paulista (20 pontos), Barone (18) e Oto Ditrich (17), além da importante participação de César Sebba, iniciado no banco e autor de 12 pontos. Já pelo lado da equipe paulista, Rosa Branca foi quem se destacou, com 22 pontos, enquanto Renê Salomon marcou 15. Dois dias depois, no Ginásio do Parque São Jorge, em São Paulo, a equipe do técnico Moacyr Daiuto, com 25 pontos de Rosa Branca, venceu por 94 x 87 e empatou a série. No dia seguinte, no Ginásio do Ibirapuera, o placar foi quase o mesmo, com vitória do Corinthians por 95 x 86, com 24 pontos do cestinha da noite, o pivô Ubiratan, mais 21 pontos do ala-pivô Renê Salomon, tendo ainda Wlamir Marques e Pedro Ives marcado 16 cada um, Rosa Branca 10 e Edvar 8. Foi assim, com um duelo entre os campeões estaduais de Rio e São Paulo, que a primeira competição oficial entre clubes a nível nacional no basquete foi concluída.

Na 2ª edição os jornais já a mencionavam como Taça Brasil, tendo ela acontecido de 3 a 6 de outubro de 1966 em Belém, no Pará. Desta vez foram cinco participantes, repetindo-se Corinthians e Vasco (que voltaram a decidir o título) e mais o Minas Tênis Clube, de Belo Horizonte, o América de Fortaleza, do Ceará, e o anfitrião, o Clube do Remo, de Belém. O torneio teria também a participação da AABB de Natal, do Rio Grande do Norte, que acabou desistindo de sua participação às vésperas do início do torneio. Eram, portanto, três clubes do Sudeste, um do Nordeste e um do Norte. O Corinthians se sagrou Bi-Campeão com mais facilidade do que havia encontrado no ano anterior, vencendo por 76 x 62 no jogo único que definiu o título.

Apesar do massivo domínio paulista no basquete brasileiro a partir de 1955, houve margem para uma grande surpresa em 1967. Em 2 de abril daquele ano, o Jornal dos Sports, do Rio de Janeiro, contava em sua página 2: "O Botafogo sagrou-se campeão da III Taça Brasil, tirando a hegemonia do Corinthians". O torneio foi um quadrangular disputado entre 30 de março e 1º de abril no Clube Municipal, no Rio de Janeiro. O título foi definido de forma dramática. Quando o placar apontava 85 x 83 a favor do Botafogo, no estouro do cronômetro, o árbitro apontou uma falta de Ilha sobre Amaury, que teria dois lances-livres a cobrar com o relógio já zarado, podendo levar o jogo para a prorogação. Ele errou logo o primeiro. No fim: 85 x 84, e um hiato na plena hegemonia paulista.


A Quebra de Hegemonia, a Ficha da Final da Taça Brasil de 1967:

01/04/1967 - BOTAFOGO 85 x 84 CORINTHIANS
Local: Ginásio do Clube Municipal, bairro da Tijuca, Rio de Janeiro
Parciais: 35 x 32 / 50 x 52 (85 x 84)
Botafogo: César Sebba (23), Barone (13), Oto Ditrich (2), Aurélio (14) e Ilha (14). Téc: Tude Sobrinho. Banco: Cianela (5), Conde (3), Luís Amaro (10) e Raimundo (1).
Corinthians: Rosa Branca (11), Wlamir Marques (33), Amaury Pasos (22), Renê Salomon (4) e Ubiratan Maciel (4). Téc: Moacyr Daiuto. Banco: Peninha (0), Renzo (4) e Mical (6).


Em 1968, a Taça Brasil foi um hexagonal (formato que seria mantido até 1974) e foi disputada em Belo Horizonte, marcando a primeira vez que o título nacional foi conquistado pelo Sirio. A tradicional agremiação da cidade de São Paulo superou ao Corinthians na última rodada por 68 x 64. As terceiras e quartas colocações ficaram com os dois representantes do Rio de Janeiro, Vasco e Botafogo respectivamente. O anfitrião, o Minas Tênis Clube ficou em quinto, e o Regatas, do Rio Grande do Sul foi o sexto. No ano seguinte, a mesma final e a forra, tendo a Taça Brasil acontecido de 14 a 18 de maio de 1969 na capital paulista. Corinthians e Sirio superaram a todos os seus adversários e decidiram o título no último jogo, com o alvi-negro paulista, de Wlamir, Rosa Branca, Amaury, Mical e Ubiratan, e Zé Geraldo como sexto homem, vencendo por 91 x 78 ao Sirio, de Mosquito, Moutinho, Radvillas, Succar e Menon. Em 1970, estas duas equipes disputaram o título pelo terceiro ano consecutivo, num hexagonal disputado entre 12 e 16 de agosto na cidade do Rio de Janeiro. Os anfitriões - Vasco e Municipal - não tiveram chance, ficando com o terceiro e quarto lugares. Desta vez o título ficou com o Sirio, com o quinteto titular formado por Dodi, Radvillas, Jatyr, Fritz e Menon, contra os corinthianos de Wlamir Marques, Amaury Pasos, Zé Geraldo, Jói e Adílson Nascimento.

Em 1971 o título da Taça Brasil seria conquistado pela primeira vez pelo interior de São Paulo. O Clube dos Bagres foi o campeão, vencendo a um quadrangular do qual também participaram o Sirio, o Minas Tênis Clube e o Arapongas, do Paraná. Curiosamente, no Campeonato Paulista só XV de Piracicaba, liderado por Wlamir Marques, havia sido campeão estadual entre os clubes do interior. Buscando crescimento econômico, o Clube dos Bagres buscaria se associar a marcas empresariais, sendo bastante inovador frente até mesmo ao que viria a ser feito mundialmente, e desta forma conquistaria seus primeiros títulos paulistas, em 1973 como Emanuel de Franca, em 1975 e 1976 como Amazonas Franca, e em 1977 em associação com a Francana, time de futebol da cidade. Eram os primeiros passos de formação do Franca Basquetebol Clube.

Só em 1973 houve o primeiro esforço de construção de um projeto grandioso de basquete fora do "Eixo Rio-São Paulo", e resultou na conquista do título da Taça Brasil pelo Vila Nova, levando a um crescimento do basquete em Goiânia, que teve três representantes na elite do basquete brasileiro nos Anos 1970, o próprio Vila Nova (clube de futebol), o Clube Jaó e o Jóquei Clube. O projeto de 1973 do Vila Nova foi arquitetado pelo veterano César Sebba, jogador que depois de se destacar pela Seleção de Goiás migrou para o basquete do Rio de Janeiro, onde defendeu a Flamengo, Vasco e Botafogo. Em 73, ele convidou ao técnico Kanela (que tinha sido seu treinador no Flamengo) e levantou recursos econômicos para a contratação de três jovens nomes já consagrados no basquete paulista - Fausto Giannechini, Adílon Nascimento e Jói - e foi ele, César, o capitão do time que conseguiu conquistar à Taça Brasil de 73, num heptagonal que teve a presença de um trio paulista - Palmeiras e Sirio, da capital, e o Trianon, de Jacareí, do interior - e do penta-campeão carioca Fluminense. Campeão brasileiro de 73, o basquete goiano ainda viria ao próprio Vila Nova ficar com o vice em 1974, e veria ao Jóquei Clube ser semi-finalista nas edições de 1978, 1979 e 1980, com um projeto que permaneceria forte até 1982, e que ainda disputaria a Taça Brasil até a edição de 1986.

foi tentado um novo modelo de competição, com a realização do 1º Campeonato Nacional de Basquete, que historicamente veio a ser a 11ª Taça Brasil. Mas foi uma tentativa de um campeonato novo. De 1965 a 1974, a Taça Brasil foi na maioria das vezes um hexagonal (por desistências, houve anos que foi pentagonal ou até um quadrangular), disputada sempre numa mesma cidade-sede durante uma semana. Em 1975 se tentou copiar o modelo do Campeonato Brasileiro de Futebol, tendo a competição reunido 10 clubes e sem sede fixa. Os dez participantes foram dois da cidade de São Paulo (Sirio e Palmeiras), dois do interior de São Paulo (Franca e Campinas Tênis Clube), dois do Rio de Janeiro (Flamengo e Vasco), dois de Minas Gerais (Minas Tênis Clube e Círculo Militar), e dois de Goiânia (Goiás e Jóquei Clube). O modelo só foi usado naquele ano, já que impeditivos financeiros não viabilizaram uma segunda edição, em 1976, ano que o basquete brasileiro não teve campeão, com a partir de 1977 o torneio voltando a ser num molde similar ao das primeiras edições da Taça Brasil.

Após a transformação no modelo que não funcionou em 1975 e a não realização da competição de 1976, a partir de 1977 o formato da competição passou a ter a participação de 8 clubes, com um ligeiro aumento frente àquele de 1966 a 1974. A disputa continuava sendo no formato de "ilhas", isto é, grupos em sede única e com todos os jogos de cada grupo realizados numa mesma semana. O que mudou foi que passou a haver uma 1ª fase com dois grupos de quatro clubes cada, nos quais os dois primeiros colocados avançavam para um quadrangular final em mata-mata, em sede única, sendo jogadas as semi-finais e a final. A Taça Brasil manteve este formato de 1977 a 1981, quando voltou a crescer.

Curiosamente, o que motivou a mudança de modelo foi justamente o argumento de que os resultados estavam muito concentrados em São Paulo, e que era preciso fazer o basquete ganhar força em outras regiões do país. Este argumento passou a ser defendido, em especial, depois que o time de Franca ganhou a edição de 1980 com extrema facilidade, superando a todos os adversários por mais de 20 pontos de diferença. Naquela edição, o bi-campeão das duas edições anteriores, Sírio, por divergências políticas, decidiu não disputar ao torneio, tendo a Francana sido a única equipe paulista naquela edição.

No 1º semestre de 81 ainda houve uma última edição naquele formato, mas naquele ano foi decidida pela mudança, tendo sido disputada uma outra edição da Taça Brasil no segundo semestre. Sim, houve duas edições do torneio nacional em 81, uma vencida pelo Tênis Clube São José e outra pela Francana.

De 1981 a 1989 a Taça Brasil passou a ter novo formato, sendo disputada por 16 clubes e ganhando uma fase a mais. Na 1ª fase eram quatro grupos de quatro clubes, com os dois primeiros colocados de cada grupo avançando à 2ª fase, na qual eram dois grupos de quatro que classificavam os dois primeiros para a fase final, jogada num quadrangular no qual todos se enfrentavam. Adicionalmente ainda foram jogados alguns "Zonais", nos quais alguns clubes de menor investimento tentavam a classificação para estar entre os dezesseis que disputariam a Taça Brasil.

Com este modelo, a penetração geográfica da competição passou a ser bem maior. Entretanto, uma coisa não mudou e, muito pelo contrário, ficou ainda mais evidente: o amplo domínio paulista. Em muitas oportunidades o quadrangular final foi disputado todo ele por clubes do estado de São Paulo. Foi o que aconteceu nas edições de 1982, 1983, 1985 e 1986. Poucas vezes houve a presença de "penetras" não-paulistas: em 1981 foi o Fluminense, em 1984 o Flamengo, em 1987 o Vasco, e na edição de 1988-89 (que cresceu, tendo a participação de 20 clubes), nela a fase final foi num hexagonal e não num quadrangular, o Flamengo entrou de penetra para disputar o título contra cinco clubes paulistas. Nas fases semi-finais (grupos da 2ª fase), entre aqueles que conseguiram dar mais trabalho aos paulistas, destacam-se as campanhas do Ginástico, de Minas Gerais, e do Jóquei Clube, de Goiás, sem que, no entanto, nenhum deles tivesse obtido o logro de jogar à fase final.

Independente do modelo, portanto, era muito difícil competir com a força econômica do estado de São Paulo. Os resultados mostravam isto, nas 24 edições da Taça Brasil disputadas entre 1965 e 1989, só duas vezes o título não iria para São Paulo, com as conquistas do Botafogo em 67 e do Vila Nova em 73. E mais, em 15 vezes tanto o campeão quanto o vice foram paulistas. Nos Anos 1980, os números indicavam um domínio ainda mais massivo, tendo em quatro oportunidades todas as quatro primeiras posições sendo paulistas. Mas a força estava mais na capital do que no interior. Destes 22 títulos da Taça Brasil conquistados pelos paulistas, 16 foram para a capital e 6 para o interior. A cidade de São Paulo ergueu o troféu com o Corinthians em 1965, 1966 e 1969, com o Sirio em 1968, 1970, 1972, 1978, 1979, 1983 e 1989, com o Palmeiras em 1977, e com o Monte Líbano em 1982, 1984, 1985, 1986 e 1987. Já o interior do estado conquistou o troféu com o Franca em 1971, 1974, 1975, 1980 e 1981, e com o São José em 1981 (ano em que foram disputadas duas edições do torneio).

A partir de 1990 a competição cresceu, tendo sido organizada pela Confederação Brasileira de Basquete (CBB) a Liga Nacional, uma competição em turno e returno e todos jogando contra todos, e os primeiros colocados avançando para duelos mata-mata até a definição do campeão. O domínio paulista ficou ainda mais latente nas edições disputadas entre 1990 e 2003, tendo em 14 edições, o título só ficando fora do estado de São Paulo em três delas, com as conquistas do Corinthians de Santa Cruz do Sul, do Rio Grande do Sul, em 1994, e com o bi-campeonato levantado pelo Vasco em 2000 e 2001 (ainda assim em condições especiais, cujo projeto consistiu em comprar o time inteiro de Franca que havia sido tri-campeão brasileiro nos anos imediatamente anteriores).

A geografia de dominância da bola laranja no estado de São Paulo neste período mostraria uma mudança frente aos resultados das décadas anteriores, com a ampla concentração de troféus sendo levantados pelos times do interior de São Paulo. Dos 11 títulos brasileiros conquistados pelos paulistas entre 1990 e 2003, só 1 foi para a capital, conquistado pelo Corinthians em 1996, todos os outros 10 troféus foram levantados pelo basquete do interior, tendo o Franca sido o campeão em 1990, 1991, 1993, 1997, 1998 e 1999, o time de Rio Claro em 1992 e 1995, o de Bauru em 2002 e o de Ribeirão Preto em 2003.

A geografia do basquete brasileiro mudaria a partir de 2004, e nas 12 edições seguintes nenhum título seria conquistado pelo basquete paulista, tendo havido uma maior diversificação territorial daqueles que vieram a levantar ao troféu, que foi uma vez para o Estado de Minas Gerais, com o título do Uberlândia em 2004, quatro vezes para Brasília (o Distrito Federal), com o time da cidade conquistando o título em 2007, 2010, 2011 e 2012, e sete vezes para o Rio de Janeiro, com o time montado pela empresa de telefonia Telemar sendo o campeão em 2005, e o Flamengo tendo conquistado os títulos em 2008, 2009, 2013, 2014, 2015 e 2016.

A estrutura das competições nacionais entre clubes no Brasil foi refundada a partir de 2009, com a Liga Nacional passando a ser organizada não mais pela CBB e sim por uma entidade denominada "Liga Nacional de Basquete", numa associação em sociedade entre os clubes participantes. A força do basquete paulista se mostrava claramente presente com mais da metade dos participantes sendo sempre equipes paulistas. O título voltou a ser do estado após uma conquista do interior e uma da capital nas edições concluídas em 2017 e 2018, a primeira com o troféu indo para o time de Bauru e a segunda para o Paulistano.

Foi assim que se desenvolveu desde seus primórdios a história do basquete no Brasil, tendo estes sido os caminhos de crescimento do esporte pelo país, com os equilíbrios de força interestaduais narrados acima, desde as competições entre seleções até os primeiros embriões das competições interclubes, chegando a uma estrutura mais sólida, autônoma e geograficamente mais espaçada.



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