A origem da equipe Harlem Globetrotters remonta a 1926 no basquete de rua, já que a liga oficial era proibida para atletas negros. Ex-alunos da Escola Wendell Phillips, no sul de Chicago, reuniram-se para formar um time e ingressar na Negro-American Legion League (Liga da Legião Negra Americana). Formou-se o time Giles Post. No mesmo ano de 1926, eles obtiveram um patrocínio de um famoso salão de dança local, o Savoy Ballroom, passando a se chamar Savoy Big Five. Em 1927, insatisfeito com as condições financeiras do time, Tommy Brookings saiu da equipe junto a alguns de seus colegas e formou então os Globetrotters. Apesar do time ser de Chicago, em 1930 foi acrescentado o nome Harlem, bairro negro de Nova Iorque, para enfatizar as raizes na cultura negra, afro-descendente. Os “Globetrotters” eram os “viajantes do mundo” levando a cultura de basquete do Harlem.
O time passou a ser agenciado por Abe Saperstein. As primeiras apresentações aconteciam no Savoy Ballroom, em Chicago, mas depois que o lugar virou ringue de patinação, a saída foi colocar o time na estrada em busca de financiamentos pontuais. Todos viajavam a bordo do Ford Modelo T de Saperstein. Os Estados Unidos viviam sua Apartheid, e a presença de um agente branco abriu portas para a equipe formada apenas por jogadores negros. Assim, passaram a participar de torneios em locais como Wisconsin e Michigan sob o comando de Saperstein, que também fazia o papel de treinador.
A parte cômica que popularizou o Harlem Globetrotters surgiu em 1939, quando, em um jogo por uma liga semi-profissional, os Trotters venciam o adversário por inacreditáveis 112 x 5. Começaram então a fazer brincadeiras e arrancar gargalhadas do público. A estrela destas performances era Inman Jackson, apelidado de “O Príncipe Palhaço”. Inman girava a bola na ponta dos dedos, escondia ela nas costas, levando os torcedores à loucura quando fingia fazer um passe e a bola continuava em sua mão. Saperstein resolveu usar todos os talentos de Jackson e os Trotters passaram a usar toques de humor em seus jogos mais fáceis, depois que o time abria uma grande diferença no placar e não tinha mais que se preocupar com uma possível derrota. No início, os jogadores adversários não gostavam muito das brincadeiras e houve algumas brigas. Mas aos poucos eles conseguiram ir mudando esta aceitação negativa, transformando o jogo num verdadeiro show de entretenimento combinado a um basquete de altíssimo nível, virou um espetáculo, abusando-se de dribles e jogadas inusitadas, fazendo de suas partidas uma mistura de entretenimento, habilidades performáticas e técnica apurada. Assim, o Harlem Globetrotters fez sua estréia internacional em 1939, em Winnipeg, no Canadá. Em 1941, para aprimorar as rotinas cômicas e performáticas, Reece "Goose" Tatum se juntou à equipe para desenvolver ainda mais as jogadas de coordenação conjunta e manipulação hábil da bola de basquete, incluindo números de malabarismo, uso de mais uma bola ao mesmo tempo para enganar os adversários e aprimoramento de tiros difíceis incomuns.
Em 1940, os Globetrotters provaram que podiam fazer mais do que brincadeiras na quadra. A equipe entrou num campeonato profissional jogando sério. Primeiro, venceram ao Kenosha Royals, por 50 x 26. Depois foi a vez do New York Renaissance, por 37 x 36. Os próximos adversários batidos foram os Syracuse Reds, por 34 x 24. A decisão do título foi contra o Chicago Bruins. Os Trotters venceram por 31 x 29, e foram chamados pela imprensa norte-americana de "Campeões do Mundo". Voltaram a provar seu valor quando duelaram contra o Minneapolis Lakers, nos primórdios do basquete profissional norte-americano, numa série de confrontos entre 1948 e 1952. Os dois primeiros duelos terminaram com vitórias do Herlem Globetrotters, 61 x 59 em 1948 e 49 x 45 em 1949. Mas daí para frente os Lakers não perderam mais, obtendo cinco vitórias sobre os Trotters entre 1949 e 1952. Foram raras as derrotas, uma das primeiras foi para o Orabs Sheldon, liderados por William DeKraai, na década de 1940. Em janeiro de 1952, o Harlem Globetrotters perdeu para os Chieftains, equipe da Universidade de Seattle (time que depois passou a ser o Redhawks), sofrendo uma virada no fim e perdendo por 84 x 81. Houve uma derrota para o Washington Generals em 1962, e depois disto o Harlem Globetrotters perdeu apenas três jogos mais nos 50 anos seguintes (em 5.983 jogos disputados). Em 5 de janeiro de 1971, eles perderam em Martin, Tennessee, para o New Jersey Reds por 100 x 99 na prorrogação. Entre 1962 e 1971, o Harlem Globetrotters ficou 2.495 jogos sem perder. Depois de quebrado esse jejum, só reencontraram a derrota em 1995. No período foram 8.829 vitórias. O número é explicado pelo fato da equipe ter mais de um elenco, o que possibilitava que se apresentassem em até 4 países ao mesmo tempo.
A partir de 1947, todos os jogos dos Globetrotters passaram a ser iniciados com a música “Sweet Georgia Brown”. A partir da década de 1950, com a integração de jogadores negros nos principais times dos EUA, o Harlem Globetrotters começou a perder a capacidade de atrair os maiores talentos negros (claro, com algumas exceções, como Wilt Chamberlain em 1958-59). Tornou-se então um time apenas de entretenimento, deixando de lado as competições oficiais. Mas foi exatamente a partir desta década que o time virou um fenômeno mundial, popularizando o basquete. Em 1951, no Estádio Olímpico de Berlim Ocidental, foram vendidos 75 mil ingressos, o maior público do basquete mundial de todos os tempos. Entre os jogadores que estiveram jogando pelo Harlem Globetrotters estão grandes nomes da NBA, além de Wilt Chamberlain, também fizeram parte da equipe nomes como Connie Hawkins, Nat Clifton, Marques Haynes, Meadowlark Lemon, Jerome James e Hubert Ausbie. Outro membro da equipe popular nos anos 1970 e 1980 foi Fred "Curly" Neal, que foi o melhor driblador da história da equipe e era imediatamente reconhecível pela sua cabeça totalmente raspada, algo que à época era incomum.
Desde sua primeira visita ao Brasil, em 1951, os craques do esporte-espetáculo lotaram estádios. A primeira temporada, em 1951, foi prejudicada pelas fortes chuvas que caíram no Rio de Janeiro em maio daquele ano. O jogo de estreia da equipe americana, no Maracanã, foi adiado duas vezes. A trupe enfrentou um combinado Fla-Flu e os All Stars, formado por veteranos do basquete dos Estados Unidos. A partir daí, os Globetrotters estiveram no Brasil em 1952, 1954, 1956, 1957, 1958, 1962, 1967, 1970, 1971, 1976, 1980, 1982, 1987, 1995, 1997 e 2010. Inclui-se nestas passagens um episódio constrangedor, na turnê de 1980 houve a prisão de dois atletas, em São Paulo. Eles foram acusados de posse de drogas e de roubar pertences do hotel onde estavam hospedados. Dois meses depois, foram expulsos do país.
Por ser uma equipe de negros, eles sempre estiveram envolvidos em discussões sobre conflitos étnicos, atraindo críticas na Era dos Direitos Civis, ainda mais por ser uma equipe de negros comandada por um empresário e proprietário branco e judeu (Abe Saperstein). Em sua defesa levantou-se a voz do proeminente ativista dos direitos civis Jesse Jackson (que mais tarde seria nomeado um honorário Globetrotter) que afirmou: "Eu acho que eles têm sido uma influência positiva. Eles não mostram negros como estúpidos. Pelo contrário, eles são mostrados como superiores no que fazem". Não foram só neste campo que receberam críticas. Os hábitos circenses de seu espetáculo, jogando baldes de confetes na platéia para lhes assustar como se fosse um banho de água, além do uso de apetrechos que nada tinham a ver com o jogo de basquete, também provocaram alguns comentários negativos de certos críticos. Numa das apresentações, em Portugal, tiveram que ouvir que "eram muito bons ofensivamente, mas não sabiam defender". Decidiram então provar o quanto sabiam. Marcaram nova apresentação e os Globetrotters ficaram o tempo todo trocando bola no meio da quadra e divertindo os torcedores. Mantiveram o placar inalterado o jogo inteiro, e no último segundo fizeram uma cesta para vencer por 2 x 0 – o único 2 x 0 de que se tem notícia na história do basquete!
Os Globetrotters fizeram parte de dois filmes de grande-metragem no cinema. O time inspirou dois filmes: “Os Harlem Globetrotters”, de 1951, e “Go, Man, Go”, de 1954. Foi, no entanto, nos Anos 1970, que a turma mais divertida da história do basquete alcançou o auge de sua popularidade, passando a estrelar uma versão em desenho animado da Hanna Barbera. A primeira série teve apenas 13 episódios.
Eles voltaram em 1979, desta vez como os Super Globetrotters, um desenho animado que mostra um time de basquete formado por jogadores com super poderes que enfrentam times de super vilões na quadra de basquete, sendo que o jogo sempre valia algo importante. Os cinco jogadores entravam em seus armários e no meio do jogo saiam com super poderes. Sempre começavam o jogo com grande desvantagem, mas com os super poderes, ganhavam sempre.
Os heróis desta super equipe eram: Nate Branch, o Homem Líquido (Liquid Man), que tinha o poder de se transformar em água; Freddie "Curly" Neal, o Super Esfera (Super Sphere), que podia encolher os membros na cabeça, quicar e crescer, tendo uma cabeça com o formato de uma bola de basquete; James "Twiggy" Sanders, o Homem Espaguete (Spaghetti Man), que podia usar o corpo se esticando como uma corda ou uma escada; Louis "Sweet Lou" Dunbar, o Homem Variedade (Gizmo), que tinha um imenso penteado afro "black power", e conseguia tirar uma série de bugigangas do cabelo que sempre ajudavam na conjuntura do momento; e, por fim, Hubert "Geese" Ausbie, o Multi-Homem (Multi Man), que podia se multiplicar e surpreender os inimigos. Em 1982, eles ganharam uma estrela na calçada da fama de Hollywood.
Eles voltaram em 1979, desta vez como os Super Globetrotters, um desenho animado que mostra um time de basquete formado por jogadores com super poderes que enfrentam times de super vilões na quadra de basquete, sendo que o jogo sempre valia algo importante. Os cinco jogadores entravam em seus armários e no meio do jogo saiam com super poderes. Sempre começavam o jogo com grande desvantagem, mas com os super poderes, ganhavam sempre.
Além de suas centenas de jogos de exibição, o Harlem Globetrotters voltou lentamente para o basquetebol competitivo depois de 1993 sob a nova administração, do ex-jogador Mannie Jackson. Em 12 de setembro de 1995, sofreram nova derrota, perdendo por 91 x 85 para o Kareem Abdul-Jabbar All Star Team, em Viena, na Áustria, terminando uma suposta execução de 8.829 vitórias consecutivas que remontavam a 1971. Em 1995, Orlando Antigua tornou-se o primeiro latino-americano e o primeiro jogador que não era negro a fazer parte do Harlem Globetrotters. Mas não havia mais como mudar a marca que estava construída e foi a grande responsável pela popularização mundial do basquete. As pessoas queriam ver o lado circense daquela trupe, admirando a enorme e quase inacreditável habilidade de seus jogadores, mas queriam diversão e não o jogo competitivo. Ainda assim, eles decidiram dar uma última demonstração do que eram tecnicamente capazes.
Em novembro de 2003, o Harlem Globetrotters realizou a Tour No-Nonsense, na qual enfrentou equipes do basquete universitário norte-americano. Não venceu todos os jogos, mas provou do que era capaz. Ainda mais quando sua principal estrela era um veterano de 33 anos, Cedric Ceballos, há muito tempo já distante de seus melhores momentos na NBA. Houve derrotas para as equipes das Universidades de Vanderbilt, de Maryland e para a UTEP, mas os Globetrotters venceram as equipes das Universidades de Michigan, de Massachusetts, e venceu a equipe então campeã da NCAA, o Syracuse Orange (vitória por 83 x 70), uma vitória confortável, na qual a vantagem chegou a ser de 17 pontos no primeiro tempo. Havia a ressalva de que Syracuse estava desfalcado de sua principal estrela, Carmelo Anthony, que havia sido a razão principal pela qual o time venceu o Campeonato Nacional da NCAA no ano anterior. Mas ainda era o campeão e com vários nomes que foram futuras escolhas no Draft da NBA, como Hakim Warrick, Demetris Nichols e Darryl Watkins. Em razão destas derrotas e de suas repercussões negativas, em 2004, a NCAA proibiu jogos de exibição dos Globetrotters contra equipes universitárias.
O Harlem Globetrotters já estava muito distante daquilo que houvera sido nos seus tempos áureos, no qual representavam a nata do basquete negro das ruas que não era aceito nas grandes ligas. No século XXI, era uma equipe de jogadores de basquete reais, mas um plantel composto por jogadores que não haviam conseguido encontrar espaço nem NBA nem nas equipes mais fortes do basquete europeu. Durante muitos anos foi válido o questionamento do que seria de um confronto entre os Globetrotters e uma equipe profissional da NBA. O questionamento tinha lá sua validade até os Anos 1970, 1980, mas depois disto, o salto de profissionalização da liga profissional norte-americana, e o caráter dos Trotters já muito distante daquilo que fora em seus tempos áureos, não davam mais razão a tal questionamento. Ainda assim, quando venceu o Campeão da NCAA, eles ainda provaram o quão competitivos eram quando jogavam para valer. Eternamente mitos!
Muito bacana. Podemos compartilhar no Face? Represento o Memorial do basquete de Ponta Grossa e o Harlem Globe trotter se apresentaram na cidade pelo menos duas vezes.
ResponderExcluirA vontade, André. O objetivo aqui é disseminar ao máximo a história do basquete.
ExcluirAchei hoje essa relíquia de página. Belo trabalho de pesquisa e um ótimo texto. Parabéns!
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