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segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Estrangeiros naturalizados na Seleção da Espanha de basquete masculino


O tema naturalização para defender seleções nacionais sempre gera polêmica, em todos os lugares e em todos os esportes. O Brasil por exemplo, viveu uma enorme polêmica no início dos Anos 2010 que foi dada a naturalização ao norte-americano Larry Taylor, natural de Chicago, para defender à Seleção Brasileira. Até 2023, ainda o único caso de um estrangeiro a defender à Seleção Brasileira de Basquete Masculino. Na Espanha, foram muito mais as naturalizações que já aconteceram no basquete masculino, entretanto ainda assim o tema sempre provoca uma grande polêmica.   

Joga-se mais holofote sobre o assunto dado o sucesso da Espanha no basquete no Século XXI. Antes deste sucesso, quando apesar da Espanha ter conquistado um título de Eurobasket nos Anos 1980, o selecionado espanhol não costumava figurar entre as cinco ou seis maiores forças do basquete mundial, e talvez por isto as polêmicas não tivessem a mesma dimensão.

Pois os dois maiores casos de sucesso de jogadores naturalizados com a camiseta de basquete espanhola se deram justamente em meio ao auge de conquistas da Espanha no basquete masculino: o congolês Serge Ibaka e o montenegrino Nikola Mirotic, ambos com papel de sem dúvida terem dado grandes contribuições de qualidade técnica para alguns dos resultados obtidos em quadra pelo selecionado nacional, tendo Ibaka e Mirotic se consagrado campeões europeus e medalhistas olímpicos.

Numa região do mundo onde temas nacionalistas e raciais esquentam até mesmo a dificuldade de obtenção de uma unidade nacional, é justo começar esta lista de naturalizados por um filho da África. Antes de conseguir construir uma carreira brilhante no basquete profissional da NBA, nos Estados Unidos, onde atuou desde 2009, Serge Ibaka teve concedida uma carta de nacionalização. Com a Seleção da Espanha, o pivô nascido no Congo, conquistou o título do Eurobasket de 2011 na Lituânia, tendo tido atuação destacada na partida final que decretou o título espanhol. Ele ainda participou do grupo que ficou com a Medalha de Prata nos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres, derrotado pelos EUA na final, e do que caiu para a França nas quartas de final do Mundial de 2014. Talvez um pouco por conta de toda a polêmica que sua naturalização causou, sua campanha com a camisa da Espanha não teve a continuidade esperada. O fato é que desde então entre lesões, pedidos de dispensa, e vetos da franquia NBA a qual estava vinculado, ele não se juntou mais à seleção.


A FIBA só permitia que houvesse um naturalizado por seleção. Assim, durante este início de Anos 2010, Ibaka se alternou nesta vaga com o ala-pivô do Barcelona Nikola Mirotic, jogador nascido em Montenegro, uma das repúblicas que no passado formavam a Iugoslávia. A Federação Espanhola apelou à FIBA para não considerar o caso de Mirotic como aplicável à restrição de um naturalizado por seleção, alegando que desde jovem ele defendeu à Seleção da Espanha na base, mas a reinvindicação não foi aceita. De fato, Nikola Mirotic disputou e foi campeão do Eurobasket Sub-20 pela Espanha em 2011. Na seleção principal, só foi convocado, por causa desta regra da FIBA, após as ausências de Ibaka após 2015. E foi justamente no Eurobasket de 2015 que ingressou no time espanhol, chegando campeão da competição na França. Também fez parte da equipe que foi Medalha de Bronze nas Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. Depois disto, migrou para a NBA, e passou a ter os mesmos problemas de Ibaka para obter liberação para disputar competições internacionais pela Espanha.


Mas muito antes de Ibaka e Mirotic, a presença de estrangeiros nacionalizados com a camisa da Espanha já era bastante comum. E a maioria deles foram de jogadores nascidos nos Estados Unidos. A dupla que deixou uma maior marca defendeu a camisa da Espanha nos Anos 1970, dois jogadores que fizeram história pelo Real Madrid, Wayne Brabender e Clifford Luyk. A naturalização do primeiro gerou uma enorme polêmica, e foi tratado pela imprensa espanhola como um grande escândalo à época. Mas sua passagem foi um sucesso. Brabender tinha um excelente arremesso de fora do garrafão, e era exímio nos lances-livres, obtendo o recorde em Campeonatos Mundiais, ao haver acertado 39 consecutivamente, sem errar nenhum, no Mundial de 1974 em Porto Rico. A nacionalização de Brabender aconteceu depois da de Luyk, numa época na qual a FIBA não tinha a restrição que só permitia um nacionalizado. O pivô, famoso por seus ganchos dentro do garrafão, também foi bem sucedido, defendendo à Espanha de 1968 a 1975. Com Brabender e Luyk juntos, a Espanha foi Medalha de Prata no Eurobasket de 1973, em Barcelona.

Wayne Brabender disputou com a Espanha os Eurobaskets de 1971, 1973, 1975, 1977, 1979 e 1981, as Olimpíadas de 1972 e 1980, e os Campeonatos Mundiais de 1974 e 1982. Clifford Luyk disputou os Eurobaskets de 1969, 1971, 1973 e 1975, as Olimpíadas de 1968 e 1972, e o Campeonato Mundial de 1974. Portanto, os dois defenderam juntos a camisa espanhola em três Campeonatos Europeus, um Campeonato Mundial e uma Olimpíada.

Mais recentemente, outros norte-americanos defenderam à Espanha, que foram os casos de Johnny Rogers, Mike Smith e Chuck Kornegay, todos sem o mesmo êxito de Brabender e Luyk. Rogers, jogador que defendeu Real Madrid, Valencia, Murcia, Cáceres e Lleida, jogou 16 partidas na preparação para as Olimpíadas de 2000, mas ficou de fora da lista final. Mike Smith, jogador que defendeu a Málaga, Joventut Badalona, Real Madrid, Sevilla e Alicante, jogou pela Espanha os Eurobaskets de 1995 e 1997, e Kornegay foi Medalha de Bronze no Eurobasket de 2001. Todos três jogadores de força física e que se destacavam pegando rebotes.

Mas a passagem de estrangeiros naturalizados pela Espanha é bem mais antiga que estes casos, e teve muitos nascidos na América Latina, de Argentina, Porto Rico, República Dominicana, Venezuela, Cuba, Costa Rica e El Salvador. Já em 1935, a Seleção da Espanha disputou um torneio em Genebra com quatro latino-americanos, os irmãos cubanos, e filhos de bascos, Emílio e Pedro Alonso Arbeleche, o salvadorenho Rafael Martín, e o costarriquenho Rafael Ruano.

Em 1951, os porto-riquenhos Guillermo Galíndez Antelo e Freddy Borrás Blasco fizeram parte da equipe espanhóis que disputou a primeira edição dos Jogos do Mediterrâneo, no qual o selecionado espanhol ficou com a Medalha de Prata. Nos Anos 1960, o argentino José Luis Beltrán de la Saletta, e o basco-venezuelano Juan Bautista Urberuaga, também usaram a camisa da Espanha. Já o venezuelano José Luis "Indio" Díaz foi Medalha de Prata no Eurobasket Sub-20 de 1978, e chegou a defender à seleção principal por 18 partidas.

Nos Anos 1980, quando a Espanha conseguiu pela primeira vez um título expressivo no basquete, a presença de estrangeiros naturalizados também se fez presente. O pivô argentino Juan Domingo de la Cruz, jogador do Barcelona, e que vestiu a camiseta espanhola em 131 ocasiões, tendo sido parte da equipe no Eurobasket de 1983 e do time que foi Medalha de Prata nos Jogos Olímpicos de 1984, em Los Angeles, nos Estados Unidos. Jogador que já havia defendido à Seleção Argentina Sub-20.

Esta geração também tinha um ala nascido na República Dominicana, e que veio a ser o primeiro negro a defender a camiseta da Espanha: Chicho Sibilio. Ele também jogou o Eurobasket em Nantes, na França, em 1983, mas ficou de fora da equipe que foi às Olimpíadas de 1984 por problemas de relacionamento com a comissão técnica, que o considerava uma personalidade de caráter contestador. Mas foi um jogador de participação histórica, sobretudo pelos 26 pontos convertidos na semi-final do Eurobasket de 83.


Há dois casos de filhos de espanhóis nascidos em outros países da Europa. O ala russo Chechu Biriukov, filho de uma espanhola que fugiu de Bilbao durante a Guerra Civil Espanhola, e nascido em Moscou. Chegou a jogar algumas partidas com a Seleção Russa, mas optou por defender à Espanha, realizando o sonho da mãe. Com a Seleção da Espanha disputou as Olimpíadas de 1988 e 1992. Já o pivô Silvano Bustos García nasceu na Alemanha, de pai e mãe espanhóis, e com a Espanha jogou o Eurobasket de 1991. São dois casos que não geraram polêmica, afinal eram de fato cidadãos espanhóis, ademais de terem nascido no exterior.

Com todo este histórico de estrangeiros, a Espanha voltou a enfrentar enorme polêmica com a naturalização de Lorenzo Brown, o sexto norte-americano a defender a Espanha na história do basquete masculino. Para o Eurobasket de 2022, com as ausências de Ricky Rubio, Sérgio Rodríguez e dos irmãos Pau e Marc Gasol, o treinador Sérgio Scariolo escolheu convocar um armador com quem conviveu quando assistente-técnico do Toronto Raptors, na NBA. Foi então naturalizado em caráter de urgência Lorenzo Brown, então jogador do Maccabi de Tel Aviv, de Israel. Apesar do histórico de estrangeiros jogando pela Espanha, a questão com Brown tomou outra dimensão pelo fato de ele sequer ter defendido a camiseta de qualquer agremiação espanhola em sua carreira. Após as passagens na NBA por Philadelphia 76ers, Minnesota Timberwolves, Phoenix Suns e Toronto Raptors, ele jogou os campeonatos nacionais de China, Sérvia, Turquia, Rússia e Israel. Sem laços históricos com a Espanha, foi naturalizado para defender à Seleção Espanhola, levando a situação a um outro patamar, apesar de todo o histórico de estrangeiros no selecionado nacional do país. E Brown foi uma peça muito importante na conquista do título do Eurobasket 2022 pela Seleção Espanhola.


A grande polêmica é que Brown nunca sequer havia vivido ou jogado na Espanha. Entre as muitas manifestações de descontentamento, uma das mais contundentes e mais claras a expressar e resumir os fatores em torno da polêmica foram as palavras do então técnico da Seleção da Argentina, o ex-jogador Pablo Prigioni: "Prefiro perder com argentinos, do que tentar ganhar com uma pessoa que não seja do meu país".  Por mais que a Espanha já tivesse utilizado naturalizados outras vezes, o caso Lorenzo Brown levou a questão a outro patamar.






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